Talvez desconheça a razão de estar
vestida com toda essa roupa do passado, completamente insatisfeita com esse
paletó de rancor, de ódio, de magoa e de nojo. Fico a me perguntar como pude
chegar tão baixo, como pude contratar um alfaiate tão presunçoso, arrogante, e
preconceituoso, porém esse mesmo tão sentimental.
Embora tudo isso me deixe em total
consternação, preciso tirar esse meu traje caríssimo, mas muito pesado e já
exaustivo para desfilar nestas paralelas ondulosas da vida. Durante algumas
horas fiquei a olhar-me perante o espelho e notar a mistura heterogenia e o
contraste de cores que aquele traje exalava, e ao mesmo tempo admirar o brio
refinado e elegante desta vestimenta tão galantemente nobre e esplendidamente ofuscante.
Fiquei mais algumas horas defronte o espelho encarando aquele semblante tão
indefinível que aparecia em superior envolto naquele traje tão misterioso.
Depois de mais alguns minutos comecei a me
despir; fui então desatando os botões feitos de amargura, cada casa era feita
de antigas paixões, o paletó totalmente costurado em linhas de antigos desejos
e cortado em sedas de amor proibido. Retirando a blusa feita sobre medida de
exacerbado sentimentalismo, com punhos esculpidos de amor louco, pude perceber
o quanto ela me machucava e mais ainda, é de fato a peça de roupa que gosto
mais, ela cabe perfeitamente em mim...
Ao abrir o zíper de
incompatibilidade desta calça feita de genética inversa pude perceber o quanto
ela me feria, tão quão pesado este pano de Brim revestido em preconceito. E
assim fui me despindo lentamente, peça por peça, pele por pele, dor por dor,
lembrança por lembrança, encontros, amizades, flertes, paixões, família, amor,
tudo jogando ao chão, estou nua... Mas ainda existe um peso em mim, um imensurável
peso, e esse, não consigo tirar, pois não consigo despir alma, meu espírito
carrega vendavais líricos e furiosos...
E ao me despir, descobrir que tão
pouco importa meu traje exterior, pois ferindo ou não, lindo ou não, indomável
ou não, galante, elegante, voraz, enlouquecedor, o que importa é minha
vestimenta interior, essa talvez jamais possa ser despida por completa, esse
traje é unicamente meu, e assim em decoro posso garantir que sou alfaiate de
mim...